domingo, 31 de outubro de 2010

-Um dia aí, à noite, eu estava com insônia e comecei a gargalhar sozinho.
-Por quê, pai?
-Uma piada que eu inventei.
-Que piada?
-Então...esqueci.
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-Eu sempre me lembro, no banho, daquele seu post sobre como matar moscas de banheiro.
-É um dos meus prediletos.
-Mas você não tá gastando muito shampoo com isso?
-Não, eu uso a espuma que se forma.
-Ah tá... Será que já existe patente pra Shamposca?

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Vai ficar tudo bem, baixinho.

segunda-feira, 25 de outubro de 2010


Bettie Page?
Ou Pamela Anderson?

E ele queria usar palavras como sobrolho, vicissitude, tergiversar, queria contar que esteve na Antuérpia e pegou um trem, que tragava fumaça de charutos e caçava alces numa savana qualquer. Queria dizer que admirava Egon Schiele e que carregava no bolso a herança de um tio distante. Ele queria falar das alergias que teve na infância e de um matadouro de porcos que funcionava atrás do armazém. Queria dizer que tinha um problema no coração e que às vezes o ar lhe faltava. Que adormecia em filmes longos e que não tivera filhos. Que eram poucos os sonhos dos quais se lembrava. Que desconfiava que não sonharia mais.

sábado, 23 de outubro de 2010


Havia um boticário na Rua do Boticário. E ele deveria continuar lá porque o estado de letargia no qual saímos, Mimi, Cocó e Cocotinha, daquele balcão daquela feijoada daquele boteco daquele garçom que rabisca contas à lápis naquele balcão é grave. Grave a ponto da Galeria Olido parecer estar no Texas. Grave a ponto de pegarmos um elevador estilo anos 20 para subir um andar e acabar com o estoque de água daquele estúdio de tatuagem e jogar o copinho num amável lixo da marca Pork´s. Mas gravidade é coisa da cabeça do Newton, ou na cabeça do Newton. E como grávitons nunca foram detectados e eu nunca entendi o espaço curvo de Einstein, que venha o próximo sábado.

sexta-feira, 22 de outubro de 2010


Bem alto
porque, baby
We'll get wild, wild, wild
E assim foi. Passaram-se anos que ele marcava em cartas de baralho. E se sentava em frente à lareira e tomava um conhaque e pensava em amendoeiras. E se levantava para atiçar o fogo quando esse fraquejava. E tornava a se sentar e beber e pensar que sentia falta dela. E pegou a dama de copas com a data de 1995 e a jogou no fogo. E a viu queimar até virar cinza. E voltou a pensar em amendoeiras.

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Ela levantou o lençol e disse não é ele. Eu perguntei tem certeza? Ela respondeu que sim, que haviam se conhecido numa feira de venda de automóveis e ele procurava um Buick 1976. Eu insisti na pergunta e ela me ofereceu um café. Eu disse não, obrigado. E ela ligou a cafeteira e me perguntou se eu tomava puro. Eu falei que sim, com pouco açúcar. Ela então me serviu e apoiou a mão na chapa ainda quente. Eu disse até logo e deixei meu cartão sobre a mesa.
 
- Olha, a gente precisa sentar e conversar.
- Tenho hemorróida. É muito importante?
- Não... Deixa pra lá.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

"Porque o brasileiro, o ser humano em si, é o tipo de espécie que só aprende quando apanha na cara."

Do flanelinha da rua.

terça-feira, 19 de outubro de 2010

inverto Garret
só pra dizer
que não te quero
amo-te
Por que não dançam? (um trecho)
Raymond Carver 

Na cozinha, ele serviu-se de outra bebida e olhou para a mobília de quarto que estava no jardim da frente. O colchão estava despido e os lençóis de riscas cor-de-rosa dobrados junto de duas almofadas em cima da cômoda. Tirando isto, as coisas estavam dispostas quase da mesma maneira como tinham estado no quarto — mesa-de-cabeceira e lâmpada de leitura do seu lado da cama, mesa-de-cabeceira e lâmpada de leitura no lado da cama dela. O seu lado, o lado dela. Pensou nisto enquanto bebericava o whisky. A cômoda encontrava-se a curta distância dos pés da cama. Passara os conteúdos das gavetas para dentro de caixotes nessa manhã, e os caixotes estavam na sala de estar. Havia um aquecedor portátil junto da cômoda, e uma cadeira em verga com uma almofada decorativa aos pés da cama. Os móveis da cozinha em alumínio polido ocupavam uma parte da entrada para a garagem. Uma toalha amarela de musselina, demasiado grande, que lhes tinha sido oferecida, cobria a mesa e pendia dos lados. Um feto dentro de um vaso estava em cima da mesa, junto de uma caixa com talheres e um toca-discos, também ofertas. Um grande televisor, modelo de cômoda, estava pousado sobre uma mesa de café, e a alguns passos desta encontravam-se um sofá e uma cadeira e uma luminária de pé. Tinha ligado uma extensão à tomada e havia electricidade, as coisas funcionavam. O gaveteiro estava encostada à porta da garagem. Havia alguns utensílios em cima do gaveteiro, junto com um relógio de parede e duas gravuras emolduradas. Havia ainda na entrada para a garagem um caixote com copos, sopeiras e pratos, cada um dos objetos embrulhado em papel de jornal. Naquela manhã ele esvaziara os armários e, com exceção dos três caixotes na sala de estar, estava tudo fora da casa. Uma vez por outra um carro abrandava e as pessoas olhavam. Mas ninguém parava. Ocorreu-lhe que também ele não pararia.

Uns sintomas físicos estranhos, órgãos inomináveis em rebelião interna, neurônios fora de ressonância, coceira em movimento browniano, percolação direcionada de brotoejas, batimentos cardíacos em efeito Doppler, difusão de Bohm dos sentidos. Abstinência de House.

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Haas gostava de sentar no chão, encostado na parede, na parte sombreada do pátio. E gostava de pensar. Gostava de pensar que deus não existia. Uns três minutos, no mínimo. Também gostava de pensar na insignificância dos seres humanos. Cinco minutos. Se não existisse a dor, pensava, seríamos perfeitos. Insignificantes e alheios à dor. Perfeitos, caralho. Mas lá estava a dor para foder com tudo. Por fim pensava no luxo. O luxo de ter memória, o luxo de saber um idioma ou vários idiomas, o luxo de pensar e não sair correndo.

2666. Roberto Bolaño.
"May the force be with you"
Porque tem acontecido muita coisa boa. Como se, de fato, a vida começasse aos 40.

"há certo encanto neste mundo
mesmo que ele seja visto
por alguém como eu"

Lalo Arias (que não é o General Dodonna aí de cima)

sábado, 16 de outubro de 2010


Eu não gosto daquele boteco. Mas eu gosto daquele cara. Eu nunca consegui falar explicitamente isso pra ele, mas eu arrisco uns gestos desajeitados. Creio que no fundo ele saiba e até retribua parte da minha admiração. Ele já escreveu algo sobre a vida ser essa coisa de mão dupla, newtoniana, ação e reação. Não usou exatamente essas palavras, ou não as usou nessa ordem. Não importa. Hoje eu vou falar: Escuta, eu... aí alguém vai quebrar um copo e desviar sua atenção. Talvez role uma briga na esquina.

sexta-feira, 15 de outubro de 2010


Razão em modo off. Tentativa de recuperação através de faxina alucinada. Trilha sonora de aspirador. Simulação de lançamento em 3, 2, 1. Zero.

quinta-feira, 14 de outubro de 2010


Bandeira 3.
Outro curta com roteiro meu e direção da Denise Vieira, responsável também por essa arte.
Dois velhinhos. Um atropelamento. O que fica na garagem. O que não tem mais tempo. E uma boa dose de humor judaico, claro.

quarta-feira, 13 de outubro de 2010


Foi daqueles sonhos estranhos que tenho. Você havia esquecido seu celular na minha casa, que era outra. Chegava uma mensagem para você, dela, não minha. Ela dizia que nunca havia sentido aquilo. Eu não conseguia ler o resto. Nos meus sonhos, eu nunca consigo usar o celular. E eu não pude te avisar porque os números eram incompletos. Mas ela parecia feliz, como que contando com algo que você havia prometido.

terça-feira, 12 de outubro de 2010


"William lá é como Severino aqui. É tudo Bill."

Da série frases que passam pela minha cabeça e eu não sei o que fazer com elas e por isso publico aqui.

Dado histórico: os Severinos de fato têm o apelido de Bill.
Dado desconhecido: a origem de tal apelido.
Dado sobre mim: sim, tenho mais o que fazer.

sexta-feira, 8 de outubro de 2010


Antes éramos estranhos. Agora temos fobias e nomes pra medos. Tem medo de parafuso desatarrachado, de flor murcha, de tetra-chave, de chá vencido, de tocha apagada, de mecha mal feita, de cheiro de ralo, de bucha com cabelo, de campo de bocha, de bolacha água e sal, de cacho embaraçado, de cacho de bananas, de choque térmico, de cachaça com verme, de broche de avó, de chokito gelado, de choro contido, de churro recheado, de nicho ecológico, de bicho do pé. Tem medo de listar medos que não envolvam o c ao lado do h.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010


O ontem passa voando numa folha de jornal e engole persianas num vórtice. O vento noroeste é altamente ionizado e causa irritação. A TPM dos ventos pede excesso de cautela e um incenso de Buscopan.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Uma das coisas que mais me fascina é a irreversibilidade. No nível microscópio tudo é reversível, partículas não estão lá muito preocupadas com o tempo. Mas quando se juntam e formam a matéria e consequentemente nós, tolos seres humanos, a coisa muda de figura. O vaso que caiu e quebrou jamais será um vaso novamente, no máximo será um emaranhado de cacos colados. Minha tese de doutorado foi sobre esse tema. Não vasos, irreversibilidade. Uma modesta ode a Prigogine.O que é o tempo? Não faço ideia. E embora alguns tolos seres humanos compostos de partículas que teriam melhor serventia num vaso possam destruir nosso futuro, devem lamentar profundamente a impossibilidade de apagar nosso passado.

terça-feira, 5 de outubro de 2010


Final da terça. Ótimos roteiros dos alunos, um songbook que ganhei de um deles, um episódio hilário de The Big Bang Theory que um outro levou, coincidências que acabaram com meu anonimato, uma proposta de trabalho muito bacana, impagáveis histórias do Mario José cujo casaco vermelho eu vou surrupiar, meu pai empolgadíssimo com um guia de Paris, uma história que eu tenho quase certeza que pode funcionar, outra que eu sei que não vai mudar, um e-mail de um cara que admiro muito e que me deu uma super força, a versão corrigida do jogo bugado, meus 53 kg revisitados, um Hershey´s descoberto no fundo do armário e o Tobias dormindo de pernas pro ar.

Sol. Uma pilha de louça esperando detergente. Última aula do curso de roteiro. Histórias no papel. Fila do banco. Balde de café. Terça-feira. As costas que me deram sossego. Um e-mail atrasado de aniversário. Outro me oferecendo cupom de desconto. Um jogo bugado. Um transtorno obsessivo-compulsivo por frases curtas. Uma oração que ainda não terminei. Desordem guiada pela entropia. Quadrado mnemônico. Absolutamente tudo e quase nada. Salinger. Um dia perfeito para peixes-banana.

segunda-feira, 4 de outubro de 2010


Não é que eu sei muita coisa. É que eu me isolei por tempo demais preenchendo minhas estantes e minha cabeceira com física e literatura, aquecendo meu DVD player com incontáveis filmes. É que eu tenho Complexo de Salinger, de Pynchon, sei lá. É que eu tenho um medo filho da puta da vida lá fora. Então, quando você vier, coloca Lou Reed na vitrola.

sábado, 2 de outubro de 2010


é que eu meti os pés pelas mãos
você sabe
eu fui lá longe pra te ver
com os diálogos de Rohmer na bolsa
e uma ridícula dose de coragem engarrafada
mas parece que tudo evapora
quando a engenharia falha
e o serviço de atendimento ao consumidor
diz que você perdeu o prazo de troca

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

O bom de não se saber nada sobre alguém é que você o inventa. Você o define e logo depois se contradiz. Todos os parâmetros do mundo estão ao seu dispor para que você monte suas equações e as eleve ao grau que quiser. Mas se a realidade te basta você não precisa de nada disso. Você acorda de manhã e faz uma prece para o santo que inventou a borracha.
       
(de Lucius, quer dizer, daquele livro meu lá)