terça-feira, 29 de janeiro de 2013

aquela tensão de você estar deitado na cama com o spray de inseticida na mão só esperando o mosquito. aí você dá aquela pescada e vem a sinfonia toda na tua orelha. não tô metaforizando, não. é exatamente assim que tá rolando. é aquele vivaldi de propaganda de sabonete interrompendo a sessão de gala, bem na hora da cruzada de pernas da sharon. e fica aquele rastro espumento de aphrodisia, radiance, mystére, exuberance. você perde o faro das coisas, saca? das coisas que você tem que ir atrás. você tá bem sozinho, cara, você se dá conta que tá bem sozinho. que esse tranco todo ninguém te ajuda a segurar. o dia amanhece e alguém tá feliz porque arrumou a vida no telecurso e no final da tarde vai tomar uma cerveja com o amigo que fez no andaime. mas você não. você tá arranhando a parede com as unhas só pra esperar elas crescerem de novo. dizem que quando a gente morre elas ainda crescem por um tempo. eu não sei se isso é verdade. é o tipo de coisa que eu não vou poder contar. 

domingo, 27 de janeiro de 2013

aí!
vô te falá um troço
procê tê no coração
num tem causa pressa vida
sê de só decepção
vê se para e se liga
fica livre de armação
você pensa que o tempo
vai tirá toda tensão
não te erra minha rainha
parte logo pra ação

- e aí, gostou do meu rap?
- não.

quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

internet capenga
assalto a mão armada
fúria de michael douglas
diante da paz velada
no planeta do capitão kirk
reabertura do caso roswell
ela disse que viu john lennon
no quilômetro trinta e quatro
da route sixty six
ele tostando no sol
gritando power to the people
erro da gráfica em cartazes
make war not love
ninguém mais comenta
o fantástico programa de domingo

eu vi aquela garota passando
uma frase na camiseta
sweet like cherry
eu me perguntei
se ela também confundia
van morrison
com o vocalista do smiths
quando alguém pronunciava
rápido demais
ou se citava
simone de beauvoir
quando as torradas ficavam prontas
se se esticava toda
para pendurar o vestido
num cabide barato
de lavanderia
ou se ria
da piada mais engraçada do mundo
do monthy python
se confessava
no breve respiro de um ataque de asma
alergia a pelo de ratos
ou se usava sensodyne
para secar espinhas
eu vi aquela garota passando
e quando olhei pra trás
o puto do uri geller dobrou a rua
e a fez desaparecer
feito o coelho da alice
na cartola do mandrake

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

tem que ser perverso, saca? tipo enrolar a gravata do teu avô ao redor do pescoço da sasha grey. pensa no balboa, just a man and his will to survive. é a única lição que tu vai aprender. o resto vai vir fácil, tu nem vai ficar puto quando descobrir que a garota era falsa loura. pensa que tu tem uma glock no bolso, é com essa cara que tu vai cruzar a rua. imagina os cara tudo com sombrero na cabeça, jineteando en mi caballo, por la sierra yo me voy. las estrellas y la luna, ellas me dicen donde voy. tu tá pronto, cara. tu vai se sair de boa de qualquer parada. aí se tu quiser, tu me agradece. na hora que tu achar apropriada. tu sabe que eu tô sempre por aí.

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

tolstói não
nem esses caras
que terminam em évski
kremlin aqui
é poster de borracharia
com os anos de ouro
da rene russo

just not in the mood, baby
amanhã talvez
o quizás com nat king cole
com keep cooler morango black
só na tentativa de ser
eroticamente doce
com um toque enjoativo
pra gente se arrastar até o banheiro
e lutar pelo último comprimido
de omeprazol
as farmácias
e seus deliveries
de cápsulas paliativas
para o amor

são 19. 19 mulheres. em duas horas elas entram, saem, se movem, partem, voltam uma duas três vezes ou simplesmente não voltam mais. você não precisa olhar pros lados pra saber que naquela mesma plateia que você está, algumas estão gargalhando, outras mordiscando os lábios e aquelas que relutam um pouco mais estão ruborizadas. é, nós nos identificamos com pelo menos uma delas. não, não é verdade. nos identificamos com mais que quatro delas. temos nossas maneiras peculiares de amar loucamente, de desprezar, de vomitar nossos infernos minutos antes daquela carícia que beira o materno. e temos um prazer imenso pela cobrança. a crueldade é de nossos bens mais valorizados. e o chinaski está lá, na pequena sala de pequenas torturas cotidianas e amores talvez grande demais. tudo isso se confunde. tudo isso nos confunde. mas o que todas nós temos em comum, e porcamente escondemos, é que torcemos por aquele cara como quem torce pelo mafioso de um seriado americano. nós sempre escondemos cabeças de cavalo debaixo da cama. 

MULHERES
Adaptação de Mário Bortolotto do livro de Chales Bukowski
Teatro Cemitério de Automóveis
Rua Frei Caneca, 384
Quarta a Sábado: 21:30
Domingo: 20:30
Até 17/02

terça-feira, 15 de janeiro de 2013

é um tanto previsível o que acontece quando eu saio do meu apartamento. a vizinha velha e corcunda assiste datena o dia inteiro. em algumas madrugadas seu marido bêbado esmurra a porta. ela também assiste datena em algumas madrugadas. os taxistas do ponto cumprimentam o meu cachorro, fazem sempre a mesma piada. e eu sempre dou risada. um velhinho alimenta pombos com milho sempre no mesmo horário. certa vez ele me contou que resolveu usar um boné pra ver se os pombos o reconheciam. eles o reconheceram. grupos de funcionários de várias empresas saem para o almoço. é sempre o mesmo padrão. um gordo que tenta ser engraçado, uma japonesa que ri, um cara com calças apertadas demais que fala ao celular, outro que anda pouco atrás fumando um cigarro, uma gostosa que manipula os cabelos sem parar e tanta não fincar o salto nos buracos da calçada. o pedinte parado à frente da padaria perguntando se sobrou alguma coisa. as pessoas respondem que pagaram com cartão. alguém me pergunta como faz para chegar na beneficência portuguesa. alguns adolescentes fumam um back numa rua pequena, depois se beijam. uma senhora que ficou viúva recentemente me conta que tá difícil manter o apartamento agora grande demais. a maioria dos pedestres passa batido pelo despacho na esquina e pelas faixas de segurança. meu cachorro se recusa a fazer um caminho diferente. ele parece estar seguro de algumas coisas. eu o acompanho.

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

transar com aquele cara era como passar grecin no cabelo. eu passei a denominar a coisa toda de operação pente fino. eu juro que na hora que ele me olhava e eu sentia a intenção toda eu imaginava o cid moreira falando: começa agora a operação pente fino. ou ainda pior, do naipe da velha zebra do fantástico rindo da minha cara. mas a gente tem que passar pela merda dos 20 anos e meter uma aliança no dedo. a gente tem que dizer que os anos 80 foram incríveis e que soltamos fogos de artifício quando abrimos a porta para a primeira pizza que não foi encomendada pelos nossos pais. a ousadia tinha gosto de cheddar e a porra de um bar de mogno na sala. mas não tinha a dignidade de uma boa dose de scotch. era frisante, prosecca, decorada com aqueles malditos guarda-chuvinhas de papel crepom.

domingo, 13 de janeiro de 2013

acho que é só questão
da gente acertar o fuso
deixar passar o jet lag
consultar algum tarô
online
dispensar alguns arcanos
intrometidos
dar um lance qualquer
no mercado livre
de emoções baratas
que pra nossa comodidade
eles mandam entregar

sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

tem uma coisa na maneira que você sobe na escada
pra escolher um filme do tarkovski
tem uma mensagem subliminar no seu cartão de visitas
tem sua insuportável mania de estalar beijos no meu ouvido
e seus cabelos que fazem cócegas no meu ombro
tem aquela sua camisola de megastore que sacaneia seus joelhos
e vai se desfazer na primeira lavagem
tem seu curso rápido de inglês
e seus amigos que te pagam uma cerveja na happy hour
tem essa besteira de você querer que eu me excite com antropologia
tem seu salto preso na calçada
e as moedas que você joga pro pedinte
tem sua falta de sentido no espelho retrovisor do meu carro
e sua frieza ao alimentar o gato
tem sua medalha de ginástica olímpica
e aquilo que você faz com as pernas
esqueça o resto


quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

eu lembro daquele dia
do teu jeans surrado
tua blusa listrada
como a do freddy krueger
lembro da tua edição de bolso
de amar, verbo intransitivo
toda pintada com marca texto
e que você tava empolgado
com a faca bowie do antiquário
que você juntava moedas
pra um maço de lucky strike
lembro de você
um pouco depois
nu em frente ao espelho
me dizendo
eu inspirei aquela raça
de cães pelados do méxico
e aquela tua risada
depois a minha
hoje o velho antiquário
é uma loja do starbucks
eles escrevem meu nome no copo
eu deixo lá
o garoto com seu primeiro emprego
tem também seus olhos
e um jeito engraçado de dizer
que o café vai esfriar




o primeiro amor eu perdi numa quadra de esportes
numa cesta de três pontos
um apito do juiz
eu olhei pro lado
eu não sou cheerleader
ele tinha espinhas
eu não sabia dançar
e eu fiquei por lá
colecionando declarações de amor
dos pacotes de gotas de pinho alabarda
que hoje eu sei
é também o nome
de uma arma das guerras púnicas
e de primeiros amores
que esmigalham nossos ossos
com lâminas transversais

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

eu não tenho amigos de infância, turma bando time equipe. eu não atendo telefone, não dou parabéns, não respondo e-mail. eu não abro extrato bancário nem colaboro com organizações não governamentais. eu não sigo a máxima do não esqueço mas perdoo. eu não desvio de macumba na calçada e jogo bitucas de cigarro na sarjeta. fico em silêncio me afasto desapareço, não dou satisfação. eu finjo que não tô. minha gestão transparente se resume a doses deliberadamente corruptas de rum vodka tequila prata. eu geralmente derrubo metade do saquinho de molho em pó para macarrão instantâneo. eu escrevo biografias de manicures só pela piada de trocar os pés pelas mãos. eu não sei rimar flores dores amores, eu ainda digo tv a cores. felicidade, pra mim, é ser balconista do consórcio remaza. há 44 anos no mercado.

segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

porradaria em jogo de hóquei
no canal de esportes
da tv a cabo
caras que ficam sequelados
aos 28 anos de idade
em qualquer motel de denver
traficantes de oxicodona
que circulam em pátios
de conjuntos residenciais
policiais com lábios sujos
de donuts de framboesa
café que escorre
pelo decote de prostitutas
travestis que se chamam dorothy
cobram cinquenta dólares
e dizem amém
assim que se abaixam
e olham pela janela
de mustangs prateados
psicopatas aposentados
que se mudam para a irlanda
e testam novos sotaques
para gargantas cortadas com arame

quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

tem um único ângulo
que deixa o rutger hauer
com a cara do kirk douglas
nesse exato momento
desse único ângulo
replicante
vira spartacus
o tempo
é uma mensagem
subliminar