quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012


eu gosto de journey. pronto. era isso. eu não vou esconder mais nada de você. nem as peças daquele teu velho jogo de botão ou as pilhas do controle remoto. ah, hoje tem que pagar a conta da tv a cabo, vai passar aquele documentário sobre o jimmy carter e a gente sempre se diverte lançando tomates na tela. eu sei que isso não chega aos pés da kim bassinger vendada na frente da geladeira mas eu ando me empenhando de verdade. tô quase menos ridícula tentando me manter sob saltos agulha e pra te falar a verdade equilíbrio instável sempre me pareceu mais interessante. no resto, meu amor, vou contar com tua imaginação, eu até tirei teus livros de cabeceira do armário da cozinha. eu tava toda errada mesmo. tipo contando piada suja pra padre de confessionário como ato maior de subversão. vou deixar de te perder nas minhas entrelinhas e nos meus raciocínios que fariam descartes simular um aneurisma. pensando bem ele até teria um. e eu não quero ser responsável por isso. eu não tenho um delorean dmc-12 pra arrumar as coisas. e olha, you know i still love you, though we touched and  went our separate ways.

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012


rápida nota sobre a exposição de henri matisse

sabe aquela impressão de você ter engolido um semáforo como se fosse a tríade de suas decisões? não, você não sabe. você jogou chemicolor na faixa de pedestres onde eu ralava meus joelhos na mais ridícula oração que eu fui capaz de fazer. ou onde eu esperava que uma mini-van lotada de velhinhos que visitaram a pinacoteca me atropelasse. ali parada. feito aquela coisa do peru ficar voluntariamente prisioneiro de um círculo de giz. eu fico esperando que você finalmente baixe aquele royal flush sobre a mesa e acabe com tudo. com as minhas fichas. com meu caixa dois. com as articulações dos meus tendões que ainda me deixam ao pé da letra. então eu financiei um carro velho só pra parar de madrugada naquela loja de conveniência do posto de gasolina e pedir um pacote de rimas baratas não perecíveis. o cara olhou pra mim e depois pra câmera de segurança. não era meu melhor ângulo. não era a cara que eu tinha quando te enfiei goela abaixo minha vida e pouco depois uma dose generosa de leite de magnésia. talvez eu devesse ter escrito frágil ou este lado para cima na embalagem. mas eu ando relapsa. eu ando te delegando todas as minhas ações na tola esperança de que você não as rebata. mas você sempre se preveniu. você comprou aquela maldita raquete elétrica que torra mosquitos. é cruel, meu amor. eu desmaio com gosto de sangue e você sabe disso.

(publicado originalmente na revista clitoris)

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012


garota, deixa eu te dizer uma coisa. pode continuar ajoelhada se quiser. eu gosto de encarar tua testa cheia de rugas simuladas. mas não espere que eu siga acreditando naquele velho trauma que você plantou na tua infância. eu não vou mais afagar teu rosto ou desfazer a trança do teu cabelo. nem olhar pro retrato da tua avó e dizer que você se parece com ela. não me interrompa mais quando eu estiver cara a cara com charles bronson para que eu assine uma petição pública a favor de um injustiçado qualquer ou de um cara do greenpeace que bate punheta pra animal em extinção. você sabia, garota, que nenhum mantra de buda declamado em posições ridículas de ioga mudaria as coisas por aqui. você não é exatamente uma pollyana só porque decidiu montar uma casinha de bonecas com soldadinhos de chumbo. eu cansei de peneirar tuas lágrimas com promessas sacadas de almanaques. eu cansei de te ver fingindo que acreditava enquanto amarrava no pulso uma fita do senhor do bonfim. não tem nada disso, garota. por mais que você se esforce. por mais que você aperte os nós. gangrena não é algo tão instantâneo assim.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012


engraçado. eu jurava que havia um maço de cigarros extra na minha bolsa. e eu a virei de ponta cabeça e apalpei o forro mal costurado e recolhi pinças, batons velhos, duas canetas bic e um bloquinho de anotações. eu não sei porque carrego todas essas coisas ou porque me esqueço de manter as costas eretas. e tem dia que eu nem saio de casa só pra não ter que dar bom dia ao jornaleiro. mas hoje tem a porra do cigarro e uma notícia sobre um assassinato. aliás, um dia eu cismei que todos os assassinos fumavam minister. eu simplesmente me deixava levar por anúncios publicitários. foi essa a rédea que eu meti entre os lábios. criei até um slogan, resolvo qualquer parada. eu nem preciso te dizer que não ganhei nada com isso. nem um mísero centavo ou uma olhadela de condescendência. eu ando muito desacreditada, baby. eu tô usando aquela calça de skatista e pisando na barra até tropeçar. falando nisso, eu vou agora procurar os cadarços novos pro seu tênis, se não me engano tem um sapateiro na próxima esquina que costuma atender na hora (tô me segurando pra não te dizer que ele não pisa na bola). e olha, eu tenho certeza que antes de matar eles - não, não os sapateiros - também pedem uma porção de tremoços. e então palitam os dentes e dizem que tudo vai correr bem.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012


Primeira edição da Revista Clitoris. E tem texto meu, da Camila Fraga, do Bruno Bandido, do Mário Bortolotto, do Marcelo Mirisola, do Paulão da Velhas Virgens, do Diego Moraes e ilustrações do Gustavo Duarte. Aqui, ó.

e tem aquela série de sobriedades que vomitamos, totalmente indiferentes a engov ou receitas caseiras para evitar estragos. tem todo um mundo destilando sabedoria e olhares de desdém enquanto espetam medalhas de honra ao mérito no próprio peito. eu acabei desenvolvendo técnicas ninja para evitar que bigornas caiam na minha cabeça. mentira. foi nos desenhos da acme mesmo. aliás eu estava ao seu lado quando tentávamos, numa espécie de roleta russa, descobrir que raio de pássaro maquiavélico era aquele. chutamos de tudo. ema. avestruz. pterodáctilo fora de época. e pegamos um pedaço de carvão e com o traço mais tosco do mundo rabiscamos o contorno de um corpo humano na parede. deixamos claro, lembra? aquela seria nossa válvula de escape, não pensaríamos duas vezes caso alguma coisa saísse muito errado. e fomos até corretos o bastante. sem par ou ímpar. sem melhor de três. sem bilhete de despedida. e eu continuo ouvindo rush e me lembrando daquele dia que chamei de sagrado só porque te conheci.

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012


baby, se você me visse agora, em plena sala, dando uma de kiki dee sem elton john e mandando as duas falas de don´t go breaking my heart, você não iria acreditar. claro que eu baixei a cortina porque era capaz do vizinho samaritano pensar que era um live aid qualquer da vida e colocar doações sob minha porta. é melhor deixá-lo investir numa outra causa qualquer como controle de colesterol de beija-flores que abusam de açúcar em bebedouros de varanda. a gente tem se virado faz tempo nesse nosso jeito torto - when i was down, i was your clown - e tá bom assim. ou quase. tem esse calor e essa tua ausência sentados na cadeira aqui ao lado, aquela com a roda quebrada. como se um de certa forma tentasse equilibrar o outro. são meio desengonçados, acho que não vão muito longe com isso. mas olha, eu tô feliz hoje. tô feliz de verdade. e eu queria ter a maneira mais eficiente do mundo de te mostrar isso. eu sei que me atrapalho na minha lógica excessiva, nos meus medos, nas minhas imposições tolas e nas minhas roupas desleixadas. você não - baby, you´re not that guy. você tá mais prum destemido rocket man (que coisa esse elton john hoje). mas quer saber? assim que você mandar um houston e antes que você complete com we have a problem, eu monto a pista de aterrisagem. é, eu fui campeã nacional de lego. pode acreditar.

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012


a porra do vidro elétrico do meu carro finalmente resolveu pifar. eu tentei explicar pro cara da CET que aquele meu ataque descomunal no sinal da faria lima era só efeito colateral do calor de 123 graus que eu tava sentindo lá dentro. eu achei que ele tinha cara de fã de filme do schwarzenegger mas ele veio com um papo estranho de cinema alternativo, disse que eu devia tentar os indianos porque me acalmariam os nervos. eu não entendo como uma dança idiota com personagens que se estreparam durante o filme todo pode acalmar alguém, mas eu entendo o quanto pesaria uma multa por má criação no trânsito, se é que existe isso. se é que existe ainda alguma rua sem outdoors clandestinos onde eu vejo teu rosto. com neon e tudo. é, baby, amar você tem sido brega pra caramba. tem consumido litros e litros de suco de tomate em bloody mary´s que eu doso em copos de requeijão. e eu me ajeito na velha poltrona e fico zapeando com o controle remoto na tv aberta. é, um maldito raio arrancou minha parabólica e eu fiquei sem sinal. eu não sei como acaba a segunda temporada de the walking dead. isso não é algo que eu vou poder te contar quando te encontrar. mas tá todo mundo meio morto mesmo, e eu já nem tenho certeza se você gostava. aliás, eu ando totalmente sem certezas, eu ando duvidando até dos números do meu rg no jogo da mega sena. e o puto do destino mete quem quer ser um milionário no corujão. baby, me diz logo i´ll be back. os caras já estão dando os primeiros passos e aquela música é aterrorizante.

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012


ela fazia aquele silêncio de bíblia sem cid moreira
escancarava umas dores esquisitas
e um leve cheiro de amônia
ela passava cerol em sabonetes de banheiros públicos
e borrava os olhos com insulina
mordia latas de leite condensado
algemava os tornozelos de galinhas
antes de saltar ela disse que odiou
o último filme do dennis farina

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

tem essa coisa no sangue que se chama hemoglobina e uma língua estranha falada na mesa ao lado. tem uma impressão quase digital da tua presença e um senso analógico que não serve pra nada. porque, é sério, eu já tentei girar os ponteiros do relógio ao contrário como naquele filme com o christopher reeve. antes de ser o super homem. antes de cair do cavalo. antes de morrer. pensando bem não era esse o método dele, mas pouco importa. eu não me chamo sarah connor nem sou a porra do johnny. eu só tô arriscando aqui uma estratégia barata e nada ortodoxa pra colocar as coisas no lugar. pra fazer uma faxina naquele monte de defuntos que a gente abandonou pela sala. eu não quero mais acordar com a impressão de estar numa trincheira lá no vietnã e adquirir uma esquizofrenia por conta disso. nem ficar tramando planos sujos e mirabolantes que vão falhar assim que eu encaixar a primeira engrenagem enferrujada. eu ando é com uma saudade filha da puta da gente e querendo acertar com um estilingue o maldito pássaro dos contos de fadas que devorou todas as migalhas que me levariam, de uma vez por todas, até você.

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

meu amor, olha isso. a síndica aqui do prédio citou confúcio pra justificar a demissão de um funcionário que se chamava moisés. ela escreveu tudo isso à mão e prendeu com durex no elevador, como uma espécie de profecia àqueles que se limitavam tão somente a discutir o excesso de chuvas de verão. eu pensei naquele dia em que nos perdemos em nossas próprias confusões já despidos de qualquer filosofia que decoramos jogando imagem e ação. e você fazia aquele seu olhar de bogart e eu sempre mandava casablanca com a precisão de uma azeitona mergulhando na taça de dry martini. a azeitona que eu chamava de esther williams só pra te ver entortando a cara com minha piada ruim. quando você partiu eu convoquei uma reunião de condomínio pra solucionar a questão dos espaços vazios por aqui. mas estavam todos excitados demais com os novos procedimentos para fixação de extintores de incêndio. eram doze. como os apóstolos.