eu te revelei aquele segredo esperando todo tipo de chantagem. minha submissão vem de longe. vem d´eu tendo que dormir antes da sônia braga subir no telhado atrás de uma pipa. e o que me era oferecido como sonho tinha a forma de um adesivo colado na cabeceira. se não me engano eram personagens de um desenho animado, uma família de bolhas coloridas. bolhas coloridas e extremamente felizes. o trainspotting da infância dizendo não se assuste porque isso é só o começo. eu tranquei meu velho diário quando tudo que havia lá era a descrição de uma mosca agonizando no peitoril da janela. o resto todo da minha vida eu meti numa calculadora científica e criei um sem número de inequações. amarrei meus pulsos com fios de nylon como quem espera por um títere desempregado. embalei aquele bilhete que você me escreveu num saco plástico e ele tem pelo menos uns quatrocentos anos pra sufocar o planeta. olha, é do meu amor por você que tô falando.
sexta-feira, 27 de janeiro de 2012
quinta-feira, 19 de janeiro de 2012
não é em pandas em extinção que você pensa quando mete a cabeça no travesseiro. é na maldita insônia, nos cabelos dela, no filho da puta que desenhou uma genitália com caneta bic ao lado da sua campainha. é na briga que você vai arrumar assim que um desavisado te olhar de soslaio ao te perguntar as horas. é no jeito que ela andava ou torcia alternadamente os pulsos. é no seu telefone fixo com linha econômica que te impede de ligar pra ela e vomitar cinco dúzias de frases que você decorou de v for vendetta. você pensa na inútil gravidade que não derruba o teto sobre sua cabeça e em técnicas para torturar o pequeno príncipe. em gelar seu bourbon com cacos de vidro temperado e na garrafinha plástica que ela enchia de vida e de gatorade enquanto se alongava. você começa a matar pernilongos imaginários pra tirar da cabeça aquela música do johnny cash e tenta se lembrar da capa da playboy de maio de 95. você adquire a compulsão de estourar sachês vencidos de catchup e ler jornais velhos como se fossem máquinas do tempo. mas você sabe que ela não vai voltar porque um dia, com os olhos borrados de rímel, ela quase te convenceu que havia um sentido para tudo.
terça-feira, 17 de janeiro de 2012
tem dia que eu acordo fatalmente decidida a me apaixonar por qualquer protagonista de filme noir. bem eu. com meus jeans surrados, a camiseta branca, um all star com sola gasta, as unhas roídas, uns batons velhos perdidos na caixa de fusíveis e uma osteopenia tratada com desprezo. nesse dia eu te chamo de boyler, bogart, widmark, me sento numa mesa de canto, peço uma vodka, entreouço o diálogo de dois suspeitos que falam em código morse e transcrevo tudo num guardanapo. tento me equilibrar em saltos de sete centímetros enquanto saco meu american express com o nome de barbara stanwyck. bato na sua porta com certa apreensão e você mal me reconhece por trás dos óculos escuros demais para o meu rosto. te conto sobre o telefonema e sobre o cara que se masturbava compulsivamente atrás das araras de lingeries tradicionais daquela loja de departamento. mas minha cruzada de pernas é tão desengonçada que você começa a dar risada. e eu te peço, acende o meu cigarro, essa piteira exige demais do meu fôlego.
sábado, 14 de janeiro de 2012
sabe o que tem saído nos meus raios-x? fantasmas. vivos como formigas insanas que carregam 50 vezes o próprio peso. o foda é que eles trocaram as táticas tradicionais de assombro por sessões de análise e acham que eu tenho a estrutura da gena rowlands pra entrar no palco em plena noite de estreia, totalmente bêbada, e ainda assim desempenhar meu papel de forma a arrancar aplausos. eu não tenho a menor condição. eu desisti de tudo naquela aula que era só pra fugir da máscara de hóquei do jason. o maluco só andava e tava sempre atrás dos candidatos ao primeiro lugar da são silvestre. entendeu o ponto? tem coisa que simplesmente não adianta. tem dia que você virar pra alguém e pedir, passa a margarina, é o mais longe que você pode estar do que chamam de felicidade.
quinta-feira, 12 de janeiro de 2012
aparamos cantos, frestas, vértices, tangentes, pontas do cabelo. damos de cara com ângulos retos por conta de nossos gestos obtusos e pescamos peixes enlatados na boca do vulcão. tapamos as dores com emplastros puídos e compramos eu te amo no segundo dia da promoção. erramos notas, acordes, melodias, desafinamos a sexta-feira e o refrão. salvamos cachorros de incêndios e alimentamos gatos com ratos de experimentação. nos imortalizamos em brasões pendurados na parede branca da sala de estar. martelamos forte que é pro vizinho reclamar. lançamos o despertador pela janela pro tempo parar de passar. economizamos vírgulas pra não termos que respirar. morremos em corpos eretos e reencarnamos assim, deitados, até a chuva passar.
segunda-feira, 9 de janeiro de 2012
não é pra deus que eu ando fazendo minhas preces. é pro john wayne. é praquela paisagem inóspita no meio do nada onde eu ainda tenho a ousadia de pisar num cacto. só pra virar pra você e pedir, me ajuda com isso, dói um bocado. você vasculha as gavetas procurando uma pinça e um antisséptico e eu torço para que você não me dê alta tão cedo. eu andei rascunhando uns planos pra gente e vou precisar de um tempo razoável pra te explicar como sabotaremos cada item. porque eu aprendi até a atravessar a rua com o farol de pedestres no vermelho. também fui a única a dar um lance numa britadeira no mercado livre enquanto manuseava meu baralho de truco pra dispensar de cara uma meia dúzia de arcanos intrometidos. quer saber? acho que joguei a caixa de primeiros socorros pela janela. deita aqui do meu lado que eu quero te contar uma coisa. marion robert morrison. esse é o nome verdadeiro do john wayne.
sexta-feira, 6 de janeiro de 2012
hoje acordei
meio assim
quando o despertador tocou
steve mcqueen
desenhei um herói tosco
com capa e terno roxo
mas ficou meio ametista
com a cara do joão bosco
baixei um rock
assim à toa
toquei ao contrário
e era balboa
anos atrás
eu usava biquini
e tirava um oito e meio
de federico fellini
uma hora a gente para
de fazer rima idiota
pra não virar biografia
escrita pelo nelson motta
quinta-feira, 5 de janeiro de 2012
porque, presta atenção, a única pergunta que só tem uma resposta é "você está me escutando"? no mais, tudo está sujeito a desabamentos gramaticais classificados precocemente como detentores de sentido. é isso que a gente faz. a gente se instala no quadrinho do meio da tirinha do jornal e começa. começa sabe-se lá o quê, né? são dois dedos pro início do parágrafo e a coisa toda passa a ser anatômica. e eu nunca tive a menor condição de resistir a você. eu chego até a implorar em segredo para que você adiante aquele seu gesto inconsequente que me faz lembrar de buster keaton. numa inevitável comparação você me diz que prefere chaplin. aí a gente começa a discorrer até o momento x (olha só, chegamos quase ao final do alfabeto) em que perdemos todas as referências. bem, nunca fizemos questão de mantê-las. viramos embrulho de peixe ao lado do horóscopo picareta e o ascendente do funcionário da gráfica é ditador demais para que ele sequer pense na hipótese de sabotar nossa republicação. sabe como é, ele acredita nessas coisas. eu posso quase jurar que ele anda torcendo pela gente.
quarta-feira, 4 de janeiro de 2012
eu era aquela garota isolada na hora do recreio. tinha um tubo de drops que se chamava paquera e um jingle idiota que grudava na cabeça. então a garota isolada na hora do recreio brincava de torre de hanói até tirar o drops vermelho e mantinha um olhar de comiseração treinado exaustivamente na noite anterior. usando o mesmo espelho no qual ela calculava a desproporção áurea de seu rosto com um paquímetro roubado. havia os garotos jogando truco e apostando moedas de baconzitos até soar o segundo sinal. aí vinha a geografia e uma professora que se excitava espetando com um alfinete o sul do sudão no mapa mundi. e tinha todo aquele caminho pra estação paraíso quando o sol já estava forte demais para seus, meus, olhos desacostumados.
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