"vamos tornar as coisas mais aritméticas". ela tem essa mania de colar recados indecifráveis na geladeira e arrastar os chinelos enquanto anda. de largar o fio dental mentolado em cima da torneira. "algo não me caiu bem". ela espera que eu diga alguma coisa que ela não vai ouvir. então ela alimenta os peixes e mastiga as beiradas da unha até sangrarem. me pede um band-aid, joga a embalagem vazia pela janela e observa o que ela chama de a cura suicida. os classificados que ela rasga destacam o leilão de uma cobertura duplex com vista para um lago que não existe mais.
quinta-feira, 29 de dezembro de 2011
terça-feira, 27 de dezembro de 2011
segunda-feira, 26 de dezembro de 2011
e embora minha lanterna tenha um alcance ridículo eu me meto em becos atrás de você. eu chego até a jogar uma pedra no chão e brincar de amarelinha como se transitar entre o céu e o inferno fosse mera questão do acaso ou da minha falta de pontaria. eu me meto a ser a última girl scout que exagerou na quantidade de alvejante e fingiu surpresa ao retirar da lavadora um bocado de peças manchadas. você consegue perceber que há uma espécie de subversão nisso? quase tão dolorida quanto o último toque que você deu na minha mão antes da luz da minha lanterna de alcance ridículo se esvair de vez.
quarta-feira, 14 de dezembro de 2011
sábado, 10 de dezembro de 2011
é como uma assustadora cantiga de roda que te alerta para não pisar em poças que escondem fios desencapados. ou a merda de um musical da broadway que está em cartaz há mais de quarenta anos só porque você ainda não assistiu. tenho alimentado os ratos com teias de aranhas ruminadas apreendidas num depósito clandestino e me divirto diante da impossibilidade das múmias cortarem os próprios pulsos. meus joelhos não suportam outra oração mas eu ainda posso te salvar jogando uma rede de pesca. é só você não se afastar muito. os malditos remos me fazem navegar em círculos e eu acabo ficando enjoada.
quinta-feira, 8 de dezembro de 2011
A RAIVA - Mário Bortolotto
a raiva é implacável. me arrancou da cama e me jogou contra a parede. me fez rolar escada abaixo e me atirou rosas, granadas e carrinhos de bebê. a raiva me quer na rua, por isso me fez ouvir torch songs nos bares prediletos e tocou fogo na minha casa. a raiva esticou minha perna e me fez pressionar o acelerador. me fez derrubar semáforos e me jogou sobre um leito de hospital. a raiva me internou e ocultou meus diagnósticos. a raiva matou meu melhor amigo numa igreja às 6 da tarde num sábado de sol, a raiva tava de collant preto com uma Uzi numa mão e arroz na outra. a raiva é irônica e destrincha perus na noite de natal. a raiva redigiu meu epitáfio com uma frase de efeito. a raiva é cuidadosa. por isso me jogou na cadeia, me espancou e me fez confessar a cor das cortinas da casa dela. a raiva sabe como fazer as coisas. me serviu ópio e haxixe e disse que estava tudo bem. a raiva toca notas dissonantes e anda sempre de preto. a raiva me chamou de Bob Sands e depois gargalhou sadicamente. assim ela é. a raiva me fez dormir em pensões escrotas. a raiva respira pela boca e anda pelo corredor enquanto os anjos dormem. a raiva sabe o momento certo de te apertar o pescoço. a raiva é paciente e sincera. a raiva ri da minha cara. a raiva faz negócios com mercadores europeus. a raiva importa armas químicas e anda com cachorros felpudos nas mesmas calçadas que você. a raiva jogou boliche com meu amigo Charles, ela disse a ele que a diet coke é o sêmem do mal. a raiva é histérica e transforma banalidades em manchetes internacionais. a raiva me bateu com uma Magnum 357 no rosto. a raiva me quer vivo, por enquanto. a raiva decide o teu destino. a raiva escondeu os preservativos. a raiva fez um pacto de sangue com os burocratas das mesas envernizadas. a raiva mistura água com vinho e não quer os meninos nas portas das vernissages. a raiva não tem sexo. a raiva dorme sozinha e lê suplementos dominicais. a raiva perdeu o trem e ficou por aqui. a raiva é um espectro sobre colchoados controlando nossas vidas pelos aparelhos de tv. a raiva anda em sedãs vermelhos e recebe os caras pela porta dos fundos. a raiva me serviu leite e maionese e disse que era pro meu bem. a raiva é cheia de subterfúgios. a raiva me cortou a face com lâmina de barbear. a raiva fez a imagem se formar antes da minha retina. a raiva escreve da direita pra esquerda e de cima pra baixo e fala em cinco idiomas. a raiva dança sons africanos. a raiva vomitou no meu prato e quebrou os joelhos da minha mãe. a raiva tomou uma overdose e não morreu. a raiva é imortal. a raiva confundiu as teclas da minha máquina de escrever. a raiva me fez mendigar um litro de vinho no coração da cidade. a raiva corroeu meu fígado. a raiva fez meus amigos se voltarem contra mim. a raiva se vestiu de púrpura. a raiva é um vírus mortal. a raiva anda de cadeira de rodas. a raiva me abraçou e me beijou na boca. eu acreditei nas suas boas intenções. a raiva me levou pra cama e me entupiu de frisium. a raiva carrega ordens judiciais no bolso do paletó. raiva faz tudo em nome da lei. a raiva é onipotente e onipresente. a raiva sabe onde me escondo. a raiva estuprou minha garota numa banheira e depois a esfaqueou repetidas vezes. a raiva tem olhos vermelhos. a raiva tomou conta de mim. eu estou a caminho. é melhor limpar a área.
segunda-feira, 5 de dezembro de 2011
hemorragia interna ou uma vala grande demais pra passar uma mini-van. ainda vejo desconhecidos pelos arredores e caçambas cheias de embalagens de pizza do domingo. ontem eu me surpreendi com minha empolgação naquele filme do schwarzenegger, mas porra, tinha o robert duvall com todo aquele paternalismo latente clonando uma pá de pessoas só pra não perdê-las. quanto a você, eu te colocaria numa casa de espelhos de um parque de diversões distante e pediria pra orson welles dirigir a cena toda. e faria infinitas cópias piratas pra espalhar pelas vitrines eletrônicas de tóquio. bem ao lado das oscilações do índice nasdaq. eu abriria mão de tudo isso se fosse capaz de te escrever um verso. mas enquanto não sou, baby, joga fora aquela camiseta. vamos começar de onde nunca paramos.
quinta-feira, 1 de dezembro de 2011
sabe o que é mais engraçado? planetas estão pouco se lixando pra astrologia e casas mal assombradas sentem falta de seus fantasmas. na última vez que fui assaltada o cara falou passa tudo e eu entreguei um dossiê com tudo que eu sabia a seu respeito. agora tô aqui quebrando a cabeça com as peças que me sobraram pra te reconstruir num tabuleiro improvisado. e, na boa, saber que o cavalo só anda em L não adianta nada. e não há programa de computador que simule de maneira eficaz uma partida de GO. essa minha escassez de ferramentas pra te desvendar (de novo) é que me mata. daí eu fico aqui cutucando unhas encravadas com alicates não esterilizados e cronometrando o tempo exato de coagulação. tão cedo não vou poder calçar meus sapatos e ir atrás daquele cara pra te tomar de volta.
domingo, 27 de novembro de 2011
sou um fiasco com hai kais. então isso vai ser um borderline de verborragia aguda sujeita a interrupções de qualquer espécie. ou coisas para dizer quando a bateria do seu carro está arriada. não que eu tente efusivamente sair do lugar, mas a anti-máxima da autoajuda reza que é só você não poder pra querer. e justo hoje eu queria pegar o carro, usar uma mão no volante e a outra para afastar o cinto de segurança que dá navalhadas no meu pescoço. esse malabarismo amador todo que eu treino quando bate essa vontade insuportável te ver. porque aquele teu jeito de se sentar no banco do carona e apoiar os pés no parabrisa me dá a sensação de estar contrabandeando um legítimo rodin. e aí, baby, eu saio desafiando todos os radares na tentativa de sermos, os dois - eu deixei claro, interrupções de qualquer espécie - apreendidos por tempo indeterminado.
quarta-feira, 23 de novembro de 2011
rascunho. o bilhete que eu deixei grudado na geladeira ainda não está completo. note que há inclusive uma letra maiúscula. eu não uso letras maiúsculas a não ser quando a coisa é formal ou exige uma revisão urgente. escrever algo para você ainda me dá a sensação de estar escarrando um pedaço em desuso da minha anatomia. mas está lá, grudado naquele ímã do jack nicholson em o iluminado. bem na cena em que ele detona a porta com um machado e o resto é pânico. não perca seu tempo com isso, eu não premedito metáforas. o ímã com o número de emergência da comgás daria exatamente o mesmo efeito. as mesmas queimaduras causadas pelo amor que torra prematuramente sob formais 220 Volts.
segunda-feira, 21 de novembro de 2011
e sonny boy williamson se sentou com deus num lugar muito parecido com o tennessee e perguntou, mas que diabos foi isso? é assim. alguém pega uma picareta de quebrar gelo e arranca algo da nossa vida e diz, vai, segue aí agora. e eu olho para meus joelhos ralados da nossa última trepada sonhando ter sido sua última garota. veja bem, não é o pódio que me interessa. tampouco as medalhas de honra ao mérito. eu tenho espetadas em meu peito coisas muito mais fortes que essa babaquice toda de horóscopo e ascendentes não explica. e eu sinto uma saudade filha da puta do que a quiromante diagnosticou como linha dúbia no meu futuro. engraçado como nossa história é retórica, eu tô falando de picaretas de novo. tá um dia lindo hoje, você não acha?
sexta-feira, 18 de novembro de 2011
deixemos as cretinices de lado, empilhadas como naipes mentirosos de baralhos de mágicos fajutos. há certa malícia em baixarmos um royal flush sobre a mesa, apostamos um bocado nisso com as mangas de nossas camisas puídas e um parco resto de dignidade. a luz que vaza pela cortina vedada com grampos de cabelo é só o mundo lá fora. "ainda com amor", escrevi no espelho daquele motel fuleiro cheio de lembranças remendadas com durepox.
quarta-feira, 16 de novembro de 2011
ontem eu deveria ter te falado, antes de desligar o telefone, que pra mim não existia amor sem barry manilow. explico. eu tinha doze anos e uma inabilidade crônica para a vida. aí eu estava num acampamento cheio daquelas coisas que me davam pânico. pessoas. e tinha aquele garoto. e tinha eu e uma quadra de volleyball que eu atravessei assim que ouvi we walked to the sea, just my father and me, and the dogs played around on the sand, com a certeza de ter encontrado o que chamavam de amor. me sentei ali, ao lado dele. mentira. entre nós havia um monte de bolas. eu contei todas. lá pela 17 (eu conto rápido) ele se levantou e foi conversar com outra garota. é. daquelas que fariam fácil o papel de cheerleader na sessão da tarde. ontem, antes de desligar o telefone, eu deveria ter te falado que essa foi minha primeira lembrança do amor. ter te falado que eu entendo cada garota que se encanta com você mas que não aceito a recíproca. eu ando muito egoísta. não deixei nem você saber que assim que desliguei o telefone eu, que me tornei um fiasco em esportes, coloquei mandy pra tocar.
segunda-feira, 14 de novembro de 2011
eu uso luvas cirúrgicas pra não amarelar os dedos com nicotina enquanto aquele cara comemora o primeiro lugar no vestibular de medicina subindo a brigadeiro luiz antônio numa bmw conversível branca. pouco antes de eu apagar bruce willys tem que resolver um enigma proposto num orelhão da sétima avenida. quando ia a santo ivo encontrei 1 homem com 7 mulheres, cada mulher com 7 sacos, cada saco com 7 gatos, cada gato com 7 gatinhos. homem, mulheres, gatos e gatinhos, quantos iam a santo ivo? é assim mesmo. a gente sai fazendo conta antes de pensar e corre o risco de em 30 segundos tudo ir pelos ares. da mesma maneira ridícula que a gente se ajoelha implorando o amor de alguém que vê a coisa toda como simulação de um exercício de tai chi chuan. na superfície (ou no fundo se você quiser, eu sempre cedo) dor é isso. é algo que se forma nas dobras do nosso corpo quando estamos em posições ridículas. em tempo. só uma pessoa foi a santo ivo.
quinta-feira, 10 de novembro de 2011
eles pararam na frente da vitrine e tocaram na mão um do outro sem querer. havia uma placa precisa-se de gerente. ele disse, talvez as coisas melhorem. ela não havia alimentado o gato ou os peixes ou fora a planta que ficara sem água. ele sonhou com charles bronson, alienígenas e uma formiga pequena demais que usava um nariz de palhaço. pensaram quase que simultaneamente num lote à venda, ela numa varanda, ele no preço do metro quadrado da grama. depois não pensaram em mais nada. ela entrou na loja, tirou o chapéu do mancebo, colocou na cabeça, pagou. quando ela saiu, ainda que lentamente, ele não a reconheceu. esperou algum tempo mas a chuva ficou forte demais e lá não vendiam galochas.
quarta-feira, 9 de novembro de 2011
nas manhãs que acordo sem você são dois jatos de aerolin. olha só, eu me empolgo com situações de desespero e fico tateando no escuro até encontrar a bombinha. derrubo um bocado de coisas e as pilhas ejetadas do controle remoto seguem em movimento browniano até a parede. e eu me lembro daquele diálogo de sunset boulevard, quando joe gillis diz a norma desmond, você é norma desmond. você costumava ser grande. ela responde, eu sou grande, as fotos é que são pequenas. aí joe fala, eu sabia que havia algo errado com elas. algum tradutor achou isso tudo divino demais e chamou de crepúsculo dos deuses. e eu ando com muita coisa na cabeça para me lembrar se crepúsculo é o nascer ou o pôr do sol. não, não é isso. a bem da verdade, eu não tenho aberto as cortinas desde que tive a sensação de você estar escondido atrás delas. você sabe, fator surpresa é um tema estudado à exaustão na psicoterapia.
sexta-feira, 4 de novembro de 2011
em exatos cinco anos você vai me escrever. você vai escolher uma mídia qualquer porque você nunca encontra as bics que rolam pra debaixo da estante. você vai dizer que nós violamos tudo que foi dito sobre magnetismo, de tales de mileto a maxwell. que devíamos ter ficado juntos e completado aquele álbum de figurinhas que dava prêmios. que aquela discussão ridícula na fila do caixa do walmart foi nosso melhor disfarce. acabamos nos assustando, não um com o outro, mas com nós mesmos e nossa incapacidade de perceber o timing correto para dizer eu te amo. hoje, sem você, eu me assusto com os barulhos estranhos da geladeira frost free e me pego ouvindo nelson gonçalves sentada no banquinho de madeira que eu comprei de um cara numa kombi. eu tive sorte. logo depois alguém gritou olha o rapa e ele arrancou com tudo.
terça-feira, 1 de novembro de 2011
eu te avisei tantas vezes, odeio saramago, e você o embrulhou pra presente. eu coloquei um x em cada opção do pacote, mudou-se, endereço insuficiente, não existe o número indicado, falecido, desconhecido, recusado, ausente, não procurado, outros (especificar). nesse último ítem eu quis escrever que os aedes aegypti machos foram geneticamente modificados e morrem antes de atingir a idade de reprodução. o carteiro não achou isso lá muito plausível e eu argumentei, oras, e que plausibilidade existe em "O presente que demos ao primo maximiliano, quando do seu casamento, há quatro anos, sempre me pareceu indigno da sua linhagem e merecimentos, e agora que o temos aqui tão perto, em valladolid, como regente de espanha, por assim dizer à mão de semear, gostaria de lhe oferecer algo mais valioso, algo que desse nas vistas, a vós que vos parece, senhora, Uma custódia estaria bem, senhor, tenho observado que, talvez pela virtude conjunta do seu valor material com o seu significado espiritual, uma custódia é sempre bem acolhida pelo obsequiado, A nossa santa igreja não apreciaria tal liberalidade, ainda há de ter presentes em sua infalível memória as confessas simpatias do primo maximiliano pela reforma dos protestantes luteranos, luteranos ou calvinistas, nunca soube ao certo, Vade retro, satanás, nem em tal tinha pensado, exclamou a rainha, benzendo-se, amanhã terei de me confessar à primeira hora, Porquê amanhã em particular, senhora, se é vosso costume confessar-vos todos os dias, perguntou o rei, Pela nefanda ideia que o inimigo me pôs nas cordas da voz, olhai que ainda sinto a garganta queimada como se por ela tivesse roçado o bafo do inferno"? foi engraçado. ele tentou correr sem derrubar os cartões de natal.
sexta-feira, 28 de outubro de 2011
o coração assim, espatifado no triturador da pia. foi um vacilo meu. das inúmeras vezes que você me falou cuida do que é teu eu só ouvi uma. e eu fiquei olhando aquele peixe estrebuchar no chão enquanto ouvia roxy music, shake your hair girl with your ponytail, takes me right back, when you were young. aí me pareceu que o terceiro juiz consideraria a luta encerrada e por conta disso eu seria obrigada a prestar serviços comunitários. ele tinha de fato cara de ativista do green peace e um leve cacoete no olho esquerdo. bem, eu comecei a rir, não do cacoete, nessas horas eu até sou politicamente correta, mas é que me lembrei daquela piada que você contou inúmeras vezes. e eu ouvi todas elas. eu sabia que num certo momento você se perderia e improvisaria daquele seu jeito, mudando o nome dos personagens, o cenário do segundo ato e a umidade relativa do ar. mas você mantinha o mesmo final. sempre. esse eu nunca entendi.
(Para Paula Klaus)
(Para Paula Klaus)
quarta-feira, 26 de outubro de 2011
eu queria mesmo não te imaginar naquela sunga gasta tostando à beira de uma piscina num churrasco pré-fabricado qualquer. cercado de pessoas exageradamente vermelhas com poros dilatados que fazem piadas sobre o defunto do Kadaffi e mendigam atenção de um espantalho torto. eu queria ainda não ver você afastando a fumaça da carne de segunda pra tentar sonhar à noite com a garota de biquini amarelo que o tio do seu vizinho ganhou na porrinha. ela parece retribuir seu olhar mas instalou uma armadilha para ursos bem na metade do caminho. aquele lá no canto, com um amuleto amarrado no tornozelo, lamenta jamais ter entendido o paradoxo de braess e passou dois terços de sua vida num congestionamento. alguém corre atrás de uma boia de zebra sem válvula que rola livremente pela grama. eu invento coisas demais pra te esquecer.
segunda-feira, 24 de outubro de 2011
coisas repetitivas. uma sílaba qualquer que não se encaixa em nenhuma outra e fica ressonando bestamente na sua cabeça. bill buford, um repórter da bbs, se infiltrou entre os hooligans só pra ver qual era e acabou ficando por quatro anos. disse que a adrenalina era tanta que era impossível se livrar dela. quer saber? pra mim esse tal de bill buford definiu mesmo foi o amor. isso mesmo. as duas sílabas do amor. e se você quiser uní-las com hormônios, neurotransmissores ou aminoácidos aromáticos modificados eu não me importo. isso não vai tornar as coisas mais difíceis pra mim. mais difíceis do que já são, eu quero dizer. uma amiga escreveu assim:
"tudo o que dói transbordao choro contido irrompe pelas mãos
descarna antigas feridas que te revelam
enquanto a face plácida oculta a aflição
tudo o que fere te faz verter
os fluidos te roubam a noite mais uma vez
e a vida se esvai pelos poros"
e eu achei a coisa mais bonita do mundo.
terça-feira, 18 de outubro de 2011
ele pendurou o gancho fixador de quadros command da 3m, ajustou a corda de nylon polimet 0045 num nó de escota duplo e posicionou abaixo do nó a banqueta para cozinha milano 176. mas havia se esquecido que o antigo proprietário rebaixara exageradamente o teto com três sacos de 40 kg de gesso mvs revest. então ligou a TV. haviam trocado a apresentadora do shoptime. essa sim, aceitaria seu convite para jantar e se deliciaria com o frango totalmente crocante assado na portátil rotisserie house e depois destroçado com a faca athus que veio de brinde. e aceitaria de bom grado o anel em ouro com diamantes que ele recém adquirira no medalhão persa.
quinta-feira, 13 de outubro de 2011
saladas prontas para consumo embaladas à vácuo em sacos plásticos. códigos de barra não cadastrados pelo funcionário hipermétrope que bate punhetas canhotas para a caixa número sete. a velhinha que furou a fila do exame médico do sesc pompeia ri do estranho tubérculo em forma de mandrágora e resolve comprar velas (e olha só, ela também fura a fila preferencial alegando uma missa urgente na igreja de são judas). e eu peço ao rapaz do atendimento ao cliente, ex-funcionário do tribunal de pequenas causas, uma nota fiscal discriminatória dos últimos meses. ele disse que eu talvez possa reclamar no procon tua propriedade (e olha que engraçado, ele parecia proudhon).
terça-feira, 11 de outubro de 2011
tô soltando o freio e engolindo frases de autoajuda. são como fibras, saca? elas se juntam num bolo amorfo que não é absorvido pelo organismo e seguem um longo e merecido destino cano adentro. e eu fico imaginando a sabesp entrando nessa onda de greve e augusto cury flutuando em pepitas de ouro logo pela manhã. e você sabe, logo pela manhã bom dia já me parece uma ofensiva frase de incentivo. e eu não sei se agora devo me encher de constrangimento ao devorar um virado à paulista porque passou a ser patrimônio histórico. por que não tombam o amor do jeito que é expresso nos filmes do kar wai? fico pensando numa pá de assuntos que me tiram o sono pra depois descobrir que exageraram um bocado na quantidade de suicidas devido ao crack da bolsa em 1929. bolsa de valores. taí uma coisa que, ao contrário do suicídio, eu nunca entendi.
sexta-feira, 7 de outubro de 2011
o homem de braços curtos pagou dez e noventa naquele fascículo em promoção. ele queria montar o navio bismarck com seu leme travado para bombordo e esperar pela royal navy. e comprou cola para madeira e tintas coloridas e uma pequena serra de mão. encheu a banheira e afogou o pato amarelo de borracha até as bolhas cessarem. a água estava um pouco quente, então ele teria tempo de procurar a velha boina puída socada - e ser então o último boy scout - em algum armário alto demais. numa garrafa pet de setecentos e cinquenta mililitros deixaria um bilhete para ela com palavras que nunca havia dito.
domingo, 2 de outubro de 2011
você concatena palavras como se fizessem sentido. não é assim, meu bem. há toda uma coisa de acepção, etimologia, origem e juntá-las assim, só porque existe concordância verbal, chega a ser ofensivo. você costumava rir da minha inabilidade em montar bonecas matrioska e na verdade eu estava pouco me lixando pra rússia, pra antiga união das repúblicas socialistas soviéticas, pra são petersburgo ou pra qualquer lugar em que as pessoas estivessem falando uma língua estranha e fazendo algo diferente de matar o tempo sem você, como eu fazia. olha, eu te amo, e tua ausência é a coisa mais presente que eu tenho. joguei todos os dicionários na lixeira de recicláveis e me diverti por alguns minutos tentando encaixar retângulos de mil páginas em cilindros vermelhos. tenho que subir meio lance de escadas até lá, você sabe, e eu contei oito degraus. lá pelo quarto achei que acreditaria em você, mas existem superstições que simplesmente não funcionam.
sexta-feira, 30 de setembro de 2011
é que tem coisa que me derruba e eu não tô falando de um uppercut do cassius clay nem de tropeçar em pés descalços largados no meio da calçada. é como se o placar da minha pressão exibisse o escore 9 X 5 nos trinta e dois segundos finais do campeonato. tem uma cama adaptada aqui para acomodar meu amor deficiente que ainda não aprendeu a ler em braile.
sábado, 24 de setembro de 2011
se enfiasse, então, a cabeça no forno, assim que retirasse a grade do meio, deixaria um bilhete no bolso traseiro. mas as coisas andavam um tanto enferrujadas por lá e movê-las demandaria um pouco mais de paciência (já não tinha). fora que a porta da cozinha era daquele estilo faroeste, uma ideia dela para tornar tudo mais dinâmico (ela, que dormia nos filmes do sergio leone). então ele tirou o enorme frango do congelador, ligou o gás e sentiu uma pontada de prazer quando a primeira gota de gordura se desfez na chapa quente.
quarta-feira, 21 de setembro de 2011
pegou uma fita métrica e mediu o comprimento e a largura da sala. depois sua própria altura. pensou no capitão américa com aquela enorme estrela no peito e numa garota debruçada na janela. escreveu uma nota de óbito numa embalagem de pão e tentou montar um anagrama para carboidratos. alimentou a planta carnívora com restos de um coração transplantado. a orelha de holyfield o impressionava muito mais que a de van gogh e ele soltou uma gargalhada que se confundiu com o frouxo ruído do velho ventilador.
quarta-feira, 14 de setembro de 2011
engarrafamento monstro, saca? eu louca pra te ver, tudo regularizado, respeitando rodízio de placas e ouvindo CBN. às vezes eu tenho essa vontade de saber o que anda acontecendo no mundo pra discutir com você. ou pelo menos fingir que eu estou por dentro das coisas pra você fazer aquela cara de quem se surpreende comigo. que diferença faz, não é? a gente sempre manda o mundo às favas e escuta muddy waters. mannish boy. traduzi a primeira estrofe assim de sopetão. ficou meio esquisita com meu inglês científico demais. mas eu não fico mais cheia de dedos com nada. nesse exato momento eu tô sentando a mão na buzina para que as coisas se movam e eu te conte em primeira mão sobre o incêndio em singapura. é longe pacas, eu sei. mas quer saber? o mundo cabe direitinho naquele velho globo que você tem na sua sala. abri o vidro, a moça me deu um folheto de apartamento que eu transformei num bi-motor. ele deve chegar aí antes de mim. abra com cuidado, tenho a impressão de ter despachado meu coração junto.
quarta-feira, 7 de setembro de 2011
segunda-feira, 5 de setembro de 2011
aprendi um bocado preenchendo palavras cruzadas de jornais. chamo de destino quando carro de boi encontra letargia num cruzamento vertical e cá entre nós isso não significa nada. isso de destino, quero dizer. ninguém colou um treco na minha testa e disse mantenha-se em tua casta e tudo ficará bem. aliás nunca ninguém me disse nada mais importante que 6-horizontal-dois sintomas da alergia aguda alimentar. eu saio revirando tudo quanto é dicionário e consultando sites privilegiados por search engine optimization. dopamina. é assim que eu tô levando a coisa. todos os dias.
quinta-feira, 1 de setembro de 2011
não desisto dos meus vícios. nem daquele box de filmes do stallone que ainda está lacrado ao lado da pilha de louça suja. a vida deixou de ser biodegradável faz tempo, baby. enchi o chão de tachinhas porque o que aqueles malucos lá da índia fazem ainda me parece um truque tosco. os armários em cima da nossa antiga cama estão emperrados. dobradiças de metal. o panaca que inventou isso não pensou sequer na possibilidade de que as coisas enferrujam, que no ar que ele respira há um componente responsável por oxidação. ele, na sua pressa de ser eternizado pela porra de uma patente, sequer pensou que no armário em cima da nossa antiga cama há um isopor com doses cavalares do amor que a gente estocou. dessa vez eu estou realmente com medo que estrague tudo. quanto tempo duram coisas imersas em nitrogênio líquido, você sabe?
quarta-feira, 24 de agosto de 2011
“Rédea”, digo. Levanto a rédea na janela e olho para ela sob a luz. Não é uma peça decorativa, é só uma rédea velha de couro escuro. Não sei grande coisa sobre rédeas. Mas sei que uma parte encaixa na boca. Essa parte é chamada de freio. É feita de aço. As tiras dão a volta pela cabeça do cavalo e sobem até onde ficam seguras entre os dedos do cavaleiro, no pescoço do animal. O cavaleiro puxa as rédeas para um lado e para o outro, e o cavalo vira. É simples. O freio é pesado e frio. Se a gente tivesse de usar um negócio desse enfiado nos dentes, acho que ia entender rapidinho. Quando sentisse puxar, a gente ia saber que estava na hora. A gente ia saber que estava indo para algum lugar.
A rédea. Raymond Carver. Trecho final.
segunda-feira, 22 de agosto de 2011
você sabia, né, meu bem? eu coloquei aquela minha velha capa do mandrake e vomitei meia-dúzia de profecias enquanto girava a cartola com a mão esquerda. adquiri habilidades ambidestras, te contei? acabei batendo boca com um daqueles peruanos que vendem cd´s com versões horríveis de simon e garfunkel só porque tentei convencê-lo a montar um negócio de bungee jump no viaduto beneficência portuguesa. ele me disse que era do chile ou coisa assim e que eu tinha cara de agente da imigração. você me conhece, isso de colocar cara em mim me tira do sério. você precisava ver, juntou uma multidão, era horário de pico, cheio de gente afoita pra pegar o metrô e voltar pra casa. na hora que a coisa ficou feia de verdade eu fui embora. não vou mentir, me deu um certo pânico e quase senti um batalhão atrás de mim. mas eu nem olhei pra trás. subi os dois quarteirões até a rua de casa e bem na esquina dei um duplo mortal caindo em parada de mão. habilidades ambidestras deixam qualquer lição de vida no chinelo.
sábado, 20 de agosto de 2011
faltavam poucos minutos para o início do noticiário e o ar estava úmido demais. ela desceu as escadas se apoiando no corrimão, se aproximou dele e disse, estou com um gosto estranho na boca. ele coçou o queixo, aquela loção pós-barba era de péssima qualidade. o puto do cachorro abanava o rabo para a parede vazia e ela explicou, ele vê coisas. foi então que o âncora anunciou ataques incendiários em londres e ele sentiu uma gota de suor escorrer pelo rosto. saía bem do meio da testa.
terça-feira, 16 de agosto de 2011
E se eu realmente me importasse com o que você me diria agora, eu traduziria suas palavras como a fácil lição de encarar um recomeço de minha vida. Eu sei, você não me falou nada. Você simplesmente não se importa com aquilo que orbita ao redor de planetas outros que não seu umbigo. Sua trajetória é rasa e previsível. Como um estúpido recomeço. Mas eu não me importo com você nem com sua ideia rasa e previsível de que tudo está de acordo com o que lhe foi padronizado como conceito de adaptação pelos seus ancestrais e seus autores de cabeceira. E se coubesse a você a permissão para que eu discorresse agora sobre o que eu chamei antes de minha vida eu recusaria. Mas não cabe. Da mesma forma que não cabe a mim recomeçar o que nunca começou. Você não é nada mais que um daqueles amaldiçoados quadros de crianças que choram. Se te viram de ponta cabeça, se te invertem num espelho, se te inclinam poucos graus para a direita ou para a esquerda, você vai ver que está sendo devorado por um impiedoso e grotesco monstro, enforcado pelas mãos da sua mãe ou aliciado por seu socialmente exemplar vizinho. E tudo que cresce, porque tá fora do seu controle, são suas unhas e seu cabelo.
segunda-feira, 15 de agosto de 2011
comprei um tanque de propano e meio quilo de pólvora numa das filiais daquela megastore de materiais de construção. qualquer site liberado pelo AVAST ensina a fabricar bombas caseiras e qualquer romance meia boca acaba com essa palhaçada de amor. a coisa por aqui está assim, num enorme painel de cortiça estou pregando todos os meus planos (te agradeço por ter levado aquele quadro horroroso. eu o cobria com um lençol quando você saía) e atualizando as etapas com aquela BIC quatro cores. O verde vive falhando, mas não encare isso como um obstáculo. eu escrevo em vermelho e uso um asterisco que deixa bem claro, isso é verde. eu venho fazendo isso o tempo todo, desde que recuperei a capacidade de discernimento que você me tirou. um dia você irá acordar com uma bomba algemada no seu tornozelo. a bomba que eu construí pra você. fique tranquilo, você só vai ter a sensação de que o despertador tocou antes da hora.
quinta-feira, 11 de agosto de 2011
Há garotas que sabem dar o melhor de si, que se permitem trazer uma sacola de papel com um verdadeiro tesouro: vodca decente, pão francês, cigarros e balas de hortelã, e também comprimidos pra ressaca. Elas sabem que você é um prisioneiro e não um paspalho que se faz passar por artista, e se não sabem, pelo menos fingem com graça.
Garotas que ajudam a enxotar o cara do aluguel, que pegam a correspondência e jogam fora sem abrir porque são espertas, sabem que gente como você não recebe cheques de fundações, revistas nem cartões de Natal, que o mundo lá fora só quer encher o seu saco. Elas não dizem que você é infiel, dizem que você se vira como pode
Garotas que coçam as suas costas e não fazem perguntas inúteis. Garotas que qualquer um, menos você poderia amar e com isso estragar. Elas não precisam de um marido ciumento, não querem o yuppie amável que rala a bunda para ganhar umas migalhas. Elas se entregam ao prisioneiro, ao cara que bate a porta e apaga este mundo nojento com seus poetas sob medida e suas putinhas honoráveis. Garotas capazes de limpar persianas sem fazer comentários, que sabem quando é hora de ir embora e que jamais levarão uma estúpida flor ao seu túmulo.
Brindo a elas.
Soa como uma velha canção - Efraim Medina Reyes
terça-feira, 9 de agosto de 2011
eu vou legendar um filme inteiro em alemão pra você não entender. colocarei tremas sob as letras erradas e inverterei as falas, vou contar a história do final pro começo com um pequeno intervalo forçado aos 34 minutos que tornará as coisas ainda mais inverossímeis. um sutil curto-circuito e a tecla stop não funciona mais. eu não levo pilhas oxidadas a nenhum centro de coleta. continuam todas aqui, espalhadas pelas gavetas num sistema aleatório de distribuição. Ende.
sexta-feira, 5 de agosto de 2011
você faz um gargarejo com listerine para dissolver um bolo de algas preso na garganta e aprende que girino em inglês é tadpole. há uma gambiarra indetectável no encanamento do seu banheiro e você sabe disso pelo sorriso sarcástico do antigo zelador que você observa pela pequena angular do olho mágico. ele se casou pela segunda vez e abandonou o par de gêmeos porque não tinha como distingui-los. o aspirador incrível que você parcelou no cartão de crédito não alcança os cantos senoidais projetados pelo estagiário do niemeyer e suas plantas artificiais andam estranhamente atraindo insetos. o sistema de alarme é precário mas você tem a impressão de que ele vai disparar a qualquer momento. você tem bem mais que doze problemas bucais.
terça-feira, 2 de agosto de 2011
eu costumava ouvir neil young e ler caio fernando abreu. coisas como "eu constantemente sinto saudade das coisas que perco mas não as quero de volta. já doeu uma vez", assim que você partia. aí eu me arriscava nos horóscopos inventando ascendentes que eu não tinha. e sempre dizem, tem que ver a lua também. a lua. eu não me importava muito com aquela cara de cartão postal da lua. a lua pra mim sempre serviu para iludir cachorro desavisado ou mote para falarem do outro neil, o armstrong. e eu até falaria dele, pro tempo sem você passar. eu tocaria a campainha da vizinha do 63 com um pretexto qualquer. um abaixo-assinado solicitando a instalação de uma antena parabólica capaz de captar a transmissão de uma rádio-novela inédita de h. g. wells onde recuperam, no penúltimo capítulo, as últimas cartas que trocamos.
domingo, 31 de julho de 2011
ele ficou parado olhando para a rua como se um búfalo lhe impedisse a passagem. como se o laço que não tinha em mãos fosse curto demais. como suas pernas e aquela lembrança de bolinhos saídos do forno roubada de proust. uma vez, e isso fazia um bom tempo, enfiara um lápis nas costas de um colega de classe. pensou em, quem sabe, voltar a vê-lo e contar que havia comprado um telescópio e observara por horas a trajetória de um balão meteorológico. o búfalo mexeu por um instante a pata dianteira mas não saiu do lugar. parecia até maior.
quinta-feira, 28 de julho de 2011
ele ficou olhando para a bacia cheia de cebolas. depois pegou uma por uma e descascou. ela entrou e perguntou, por que fez isso? ele não respondeu e ficou olhando para a bacia cheia de cebolas descascadas. ela foi jogando suas roupas pela sala e em seguida os sapatos. aí ele empilhou as cebolas descascadas, montou uma pirâmide e gritou, venha ver o que eu fiz, mas ela prestava atenção em outra coisa. quando ela acordou as chamas já tomavam toda a cozinha.
terça-feira, 26 de julho de 2011
"A maneira certa de se engolir um guarda-chuva é pela parte de cima caso você se preocupe em manter o mínimo da integridade dos seus órgãos. Mesmo que o sabor não seja de seu agrado é pertinente que você controle sua ânsia ou o processo será fatalmente revertido. Evite utilizar aqueles com acionamento automático". Ele disse isso como quem lê um manual de eletrodoméstico ou prega para meia dúzia de descrentes. Aí saiu. Olhou para o céu e estendeu a mão direita com a palma voltada para cima. Usava um terno preto tingido de bolor que fora, ele disse, de seu pai. Tranquei a porta e conferi a previsão do tempo para os próximos cinco dias.
domingo, 24 de julho de 2011
ele disse que se fôssemos pescar aprenderíamos muita coisa sobre a vida e sobre nós. pesca mortal. ele vinha acompanhando o programa desde que a tal operadora de TV a cabo oferecera quinze dias a título de degustação. eu tinha dez minutos até o mercado baixar as portas e um velho all star nos pés. deixei sobre a mesa da cozinha uma lata de sardinhas em óleo comestível e um bilhete. cuidado com as espinhas. foi o que eu pude fazer. e eu tenho essa mania de nunca olhar para trás.
quinta-feira, 21 de julho de 2011
olha, ele disse enquanto se ajeitava no sofá, amanhã vou embora. ela pensou na consulta que teria com a nutricionista logo cedo. perderia oito quilos ainda antes do verão. ele continuou segurando sua mão e quase disse, vai ser melhor assim. há sete anos tiveram o primeiro filho. depois o segundo. aí ela arrumou aquele cara e ele descobriu e disse, querida, você estragou um bocado as coisas. nunca mais tocou no assunto. era importante ela se lembrar de avisar a nutricionista que sofria de doença celíaca.
terça-feira, 19 de julho de 2011
ele ficou olhando para a borda virada do tapete e depois olhou para a porta. pensou em comprar um exterminador elétrico de mosquitos e uma ratoeira ultrassônica. queria se chamar steve mcqueen e contar para sua vizinha sobre seus dias no cárcere. ele diria, entre, é só tomar cuidado com as armadilhas. colocaria o pé sobre a borda virada do tapete caso ainda não a tivesse ajeitado.
sábado, 16 de julho de 2011
sexta-feira, 15 de julho de 2011
PRECEITOS BÁSICOS E AVISOS ADICIONAIS A JOVENS ESCROQUES
Jim Dodge
Não tente roubar uma vaca maior que sua caçamba.Não mostre seu rabo pra Polícia Rodoviária.
Negociatas longas com grana curta é prejuízo na certa.
Não confunda o Evangelho com a Igreja.
Nunca dedure familiares ou amigos.
Evite morar em qualquer lugar onde não dê pra mijar da porta da frente.
Só porque é simples não significa que é fácil.
Não deixe seu olho grande preencher cheques que sua barriga vazia não possa bancar.
Se você não a quer, não a provoque.
Não estacione entre dois cachorrões jogando sujo.
Qualquer um amassa tomates; o foda é fazer o molho.
Nunca se é pobre demais para deixar de prestar atenção.
Não remoa por aí suas paranóias.
Nunca durma com uma mulher que considere isso um favor.
Se for atingido por um valentão, dê-lhe a outra face.
Se rolar de novo, atire no filho da puta.
Manter é sempre duas vezes mais difícil do que conseguir.
Nunca atravesse uma cidade pequena a 120 por hora com a filhota do xerife nua na garupa.
Nunca registre o preto no branco.Se você não está confuso então não tá entendendo nada.
Amar é sempre mais difícil do que parece.
quarta-feira, 13 de julho de 2011
eu apoiava a cabeça assim no teu colo e te perguntava sobre a guerra do golfo. você dizia antes as coisas eram diferentes e me contava como o marechal alemão Erwin Rommel fora detido em 1941. você fazia um teatro de sombras antes de falar apague o abajur e vamos tentar dormir. eu nunca entendi como você conseguia projetar aquela tarântula na parede, aquela que você explicava, não é tarântula é uma viúva negra. eu era uma péssima taxidermista e você pode ter confundido com desinteresse. e enquanto eu fingia que dormia você se levantava e observava a chuva pela janela. passava horas parado ali. eu devia ter te dito, vai ficar tudo bem, deita aqui comigo.
segunda-feira, 11 de julho de 2011
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